Hospital

Olhei para Ariel quando ouvi a sua voz tremida e mordi o interior da minha bochecha. Tinha que tentar esconder a raiva que sentia porque sabia que a afectava e isso era tudo o que menos queria. Fechei os olhos com um suspiro. A minha cabeça estava ainda a matar-me. -Queres vir para aqui? - perguntei colocando uma mão no espaço que havia na minha cama, e ainda bem que havia já que não me conseguia mover - O meu irmão? - perguntei baixinho para tentar mudar de assunto e tentei tapar-me com as mantas

Endireitei-me na cadeira, passando ambas as mãos pelas bochechas e respirei fundo, tentando controlar-me para não voltar a chorar. A última coisa que queria era perder de novo a compostura à sua frente. Olhei-o, assim que o ouvi perguntar-me se queria ir para ao pé dele e nem pensei duas vezes em assentir. Levantei-me, deixando a cadeira a um canto e aproximei-me da cama, afastando as mantas para que me pudesse a deitar a seu lado. Entrei com cuidado, deitando-me no espaço vazio que havia e cheguei-me para junto de Ryan, encostando com cuidado a cabeça ao seu ombro enquanto nos tapava aos dois.
- Não sei se as enfermeiras vão gostar de me ver aqui.- disse, sentindo-me acalmar só de o sentir ali ao pé de mim, e olhei-o ao ouvir a sua outra pergunta.- foi a casa.- respondi.- eu disse-lhe para ir e para tomar os comprimidos, mas já lhe mandei uma mensagem a dizer que tinhas acordado.- murmurei.- por isso, já deve estar quase aí.

-Eu não quero saber das enfermeiras, elas que se vão lixar todas - disse num tom baixo e de olhos fechados, sentindo-me melhor ao sentir o seu corpo ao lado do meu e ao mesmo tempo, a aquece-lo. - Pelo menos foi toma-los - suspirei baixinho e abri os olhos quando a porta se abriu olhando para o meu irmão que entrava no carro com uma expressão assustada e aliviada ao mesmo tempo.
-Acordaste - murmurou ele agarrando-se ao meu braço e aproximando-se do meu ombro que não estava a ser ocupado por Ariel.
-Acordei - murmurei de olhos fechados. - vou ficar bem puto.

Assenti ao que disse, ficando muito encostadinha a ele assim que percebi que o estava a aquecer e acabei mesmo por colocar um braço sobre o seu corpo, tendo de abrir os olhos quando a porta se abriu. Levantei a cabeça com medo que fossem as enfermeiras prontas a reclamar mas, felizmente, era apenas Dylan. Sorri--lhe ligeiramente, vendo-o logo correr para junto do irmão e, apesar de não estarmos dos mesmos lados, afastei-me ligeiramente para os deixar mais à vontade. Sorri, ao ouvir Ryan dizer que ia ficar bem, apesar de achar que era só para acalmar o irmão, mas continuei sem dizer nada, podia ser que, com o tempo. ele se convencesse de que ia mesmo ficar bem

-Pensava que ias morrer - pelo tom de voz percebi logo que estava a chorar. Suspirei baixinho por continuar a pensar de um modo egoísta que talvez isso fosse o melhor, mas voltei a olha-lo.
-Mas estou vivo e mesmo assim estás a chorar - sorri-lhe um bocadinho e ele levantou a cabeça forçando um sorriso e limpando as bochechas. Passei as mãos pelo seu cabelo e ele sentou-se.
-Estejam à vontade vocês os dois, eu vou para ali - apontou para o canto do quarto onde havia um sofá - vou dormir um bocado - estas emoções não lhe faziam nada bem por isso não disse para ele ir para casa de novo já que ainda agora tinha chegado. Ele foi para lá como tinha dito e eu puxei Ariel de novo para mim.

Mordi a parte de dentro da minha bochecha com força, ao ouvir Dylan dizer que pensava que Ryan ia morrer, e tive de virar a cara para o lado contrário deles, passando as mãos pelas minhas bochechas. Tinham sido demasiadas horas naquele hospital a esperar por notícias dele, ainda não conseguia acreditar que tudo tinha valido a pena. Já para não falar de que não dormia há mais de doze horas, estava esgotada a todos os níveis. Deixei que falassem à vontade, só voltando a olhá-los quando Dylan falou para nós os dois e assenti ao que disse, esforçando-me a dirigir-lhe um pequeno sorriso.
- Se quiseres trocar eu não me importo de ir para o sofá.- disse-lhe, apesar de ele já se estar a deitar e depois olhei para Ryan, voltando a encostar a cabeça ao seu ombro.- estás confortável? - perguntei baixinho, ajeitando as mantas em cima dele.

O meu irmão negou com a cabeça e foi-se deitar de uma forma estranha no sofá, mas se ele se sentia bem não me atrevi a comentar. Encostei a cabeça a Ariel quando ela se voltou a aproximar de mim e assenti com a cabeça. Olhei-a sem conseguir fechar os olhos sem me lembrar que nunca voltaria a andar nem a surfar e passei os dedos pela sua bochecha. - Amo-te - murmurei, nunca lhe tinha chegado a dizer desta forma.

Deixei que Ryan se encostasse a mim, chegando-me também mais para junto dele e dei-lhe um beijinho no peito, visto que era a coisa que estava mais próxima de mim. Puxei as mantas, suspirando por estar a começar a relaxar aos poucos, finalmente, mas logo senti o meu coração disparar ao ouvir o seu amo-te. Levantei o olhar para ele aos poucos, sorrindo muito, e estiquei-me até lhe dar um beijinho no queixo.
- Eu também te amo.- murmurei.- muito.

Sorri-lhe levemente quando disse que me amava muito. Estava feliz por isso, claro que estava, era impossível deixar de estar feliz por ser correspondido uma vez na vida, mas não conseguia estar completamente feliz. Tinha sobrevivido, mas para além das dores que cabeça que estava a ter e que pareciam cada vez mais fortes, as minhas pernas não se mexiam por mais esforço que eu fizesse. Saber que nunca mais ia surfar dava comigo em doido. Só me apetecia gritar e bater em alguma coisa. Ela dizia que não era justo para mim dizer que mais valia estar morto, mas ela não sabia o que se era sentir incapacitado. Eu não podia fazer nada.

Toquei nos seus lábios com a pontinha dos meus dedos ao vê-lo sorrir depois de eu ter tido que também o amava e cheguei-me um pouco mais para ele, deitando a cabeça no seu ombro. Eu estava tão feliz por Ryan estar vivo que nem sabia bem o que dizer ou até o que sentir. Era verdade que preferia que estivesse tudo bem com as suas pernas, mas eu sabia que ia ficar tudo bem, era só uma questão de tempo. Abracei-me ao seu corpo, depositando-lhe um beijinho leve no pescoço e depois voltei a subir o olhar para ele.
- Queres que eu peça alguma coisa para conseguires dormir? - perguntei baixinho.- eu sei que não é nada bom, mas precisas de descansar.

Encostei a minha cabeça à dela assentindo com a cabeça, devagarinho, assim que me perguntou se queria alguma coisa para dormir. Sentia-me agitado e não ia conseguir adormecer assim do nada. - Devias contar à tua família que estás aqui - murmurei e suspirei baixinho, sentia-me cansado apesar de tudo - eu fiz uma promessa ao teu irmão - continuei no mesmo tom e olhei-a quando consegui.

Depois de Ryan ter assentido, estiquei-me até conseguir tocar no botão para chamar as enfermeiras. Voltei depois a deitar-me junto de Ryan, tapando-o como deve de ser e juntei as sobrancelhas ao ouvi-lo falar.
- Queres que lhes diga? - perguntei baixinho.- eu só ainda não disse nada por não saber se querias que eles soubessem ou não.- expliquei, sorrindo ligeiramente de seguida.- tu vais cumprir Ryan.- murmurei, roçando os meus lábios na sua bochecha.- ainda tens o colar dele para lhe entregar, lembraste?

-Porque é que haveria de não querer? - perguntei - até já devias ter avisado onde estás, eu já lhes disse o que pensava que estava a acontecer, acho que eles querem saber a verdade- disse de olhos fechados e num tom baixo. Assenti devagarinho com a cabeça, para não me magoar e continuei de olhos fechados. Ouvi passos e abri logo os olhos.

- Desculpa.- pedi, sentindo-me mal por não ter avisado logo os meus pais e levantei o olhar para ele, passando as pontinhas dos dedos pelo seu cabelo ao vê-lo de olhos fechados.- eu vou ligar à minha mãe daqui a nada, depois de adormeceres, não te preocupes.- disse, virando a cara na direcção da porta mal a ouvi abrir-se e vi a enfermeira entrar, dirigindo-me logo um olhar de desaprovação por estar deitada na cama com ele.
- Você não pode estar aí.- ela disse, suavizando logo a sua expressão.- ou melhor, não devia.- sorri levemente, ao perceber que não me ia obrigar a sair.- do que precisam?
- Podia dar-lhe alguma coisa para conseguir dormir? - perguntei, num tom igualmente calmo, também por causa de Dylan e vi-a sair para ir buscar o que era preciso.

Não era que eu quisesse que os seus pais soubessem de tudo o que se passava, mas depois do que lhes tinha contado no outro dia o que se ia passar e da forma como o tinha feito, acho que eles mereciam saber como estava a filha e o que tinha acontecido. Suspirei com dores na cabeça e uma certa confusão nos olhos, devido à luz forte que vinha da janela e tive que fechar os olhos outra vez. Sorri, ainda de olhos fechados, quando a enfermeira disse a Ariel que ela não devia estar ali, como quem diz que não pode mas que ela deixa, até porque eu me encostei a ela. Percebi que a enfermeira tinha ido buscar o que precisava para dormir - diz ao meu irmão para ir embora, não está aqui a fazer nada - forcei-me a abrir os olhos para tomar o comprimido quando a enfermeira veio ter comigo, com ele e com água.

Voltei a olhar para a porta assim que a enfermeira voltou a entrar, já com o comprimido de Ryan e acabei por me sentar, visto que era isso que ele ia fazer também. Aproveitei para olhar para Dylan, que dormia todo torto no sofá e soltei um pequeno suspiro. Eu já gostava dele, ainda para mais depois de ver o quanto tinha sofrido por causa de tudo isto que acontecera com Ryan. Olhei para ele, assim que o ouvi falar e levantei ligeiramente as sobrancelhas, visto que estava a falar em Dylan e eu tinha acabado de olhar para ele.
- Eu posso mandá-lo embora.- encolhi os ombros.- mas duvido que ele me obedeça.- murmurei.- depois de tudo acho que o que ele mais quer é estar ao pé de ti.- voltei a chegar-me ligeiramente para junto de Ryan.- tal como eu.

Suspirei por saber que estava certa. O meu irmão era casmurro e quando punha algo na cabeça, ou tinha que ser obrigado a não o fazer, coisa que Ariel não faria, ou apenas fazia como lhe apetecia. - Tenta só falar-lhe - murmurei. Sorri já meio atordoado, por causa do comprimido, ela tinha-me dado algo forte ou então já estava a conseguir ceder ao cansaço - e eu quero que estejam comigo - murmurei - e que sejam pacientes e... - suspirei baixinho virando a cara para um dos lados mais quentes e deixei de conseguir pensar, deixando-me adormecer como tanto queria.

Era óbvio que Dylan não queria ir-se embora, depois de todo o sofrimento pelo qual tinha passado por causa de Ryan, o mais normal seria querer estar com o irmão, para, tal como eu, assegurar-se de que o facto da história do seu cancro ser mentira não ser também uma falsa conclusão médica, de novo. De qualquer das formas, eu ia tentar convencê-lo, visto que Ryan queria que eu o fizesse. Assenti, assim que me pediu que lhe tentasse falar e ajeitei as mantas em cima do seu corpo, vendo os seus olhos ficarem mais pesados ao fim de alguns segundos.
- Dorme bem.- sussurrei baixinho, debruçando-me para roçar os meus lábios na sua testa e ouvi-o falar, apesar de já estar mais a dormir do que outra coisa. Sorri, acabando mesmo por lhe dar um beijinho e depois desci os meus lábios até aos seus.- nós vamos estar sempre aqui.- voltei a sussurrar.- para tudo o que precisares.- endireitei-me, sorrindo ao ver que estava finalmente a dormir e olhei depois para Dylan, que continuava todo torto no sofá. Suspirei, abanando a cabeça e levantei-me, aproximando-me dele para o abanar devagarinho.- Dylan..- chamei num tom baixo.- acorda.

Estremeci quando alguém chamou pelo meu nome e olhei em volta, procurando logo o meu irmão com o olhar. Olhei para os riscos das máquinas para ter a certeza que o coração dele continuava a saber e só depois olhei para Ariel. - Passa-se alguma coisa? - perguntei levantando-me devagar. Voltei a olhar para o meu irmão e vi que estava a dormir, pelo menos isso, estava a descansar e assim saía dali mais rápido- ele adormeceu? O que é que se passa? - continuei a perguntar, nervoso.

Parei de abanar Dylan quando me apercebi de que estava a começar a acordar e fiquei à espera que despertasse, juntando as sobrancelhas ao vê-lo fazê-lo muito de repente, ficando logo todo preocupado enquanto perguntava o que se passava. Suspirei levemente, abanando a cabeça e continuei a olhá-lo.
- Está tudo bem Dylan.- murmurei para o descansar.- está tudo bem com o teu irmão, ele está só a descansar.- dirigi-lhe um leve sorriso e encolhi ligeiramente os ombros.- ele só me pediu para te dizer para que fosses para casa descansar um bocadinho.- disse-lhe.- ele está bem, por isso, podias aproveitar para fazer isso.- olhei-o.- ia fazer-te bem.

*Dylan*
Abanei a cabeça olhando para o meu irmão - não quero ir - disse em voz alta e sentei-me no sofá de novo, tapando-me com uma manta que estava ao lado do mesmo. Não queria ir embora agora que sabia que ele estava bem. - vou ficar aqui até ele ir embora - disse decidido e voltei a deitar-me todo tordo em cima do sofá ficando a olhar para ele.

Como seria de esperar, Dylan disse que não se ia embora até Ryan ir também. Soltei um suspiro baixo, por já saber que era aquilo que me ia responder, mas decidi que não ia insistir, visto que eu também não me ia embora.
- Eu não te vou obrigar a nada.- murmurei ainda a olhá-lo.- mas se precisares de ir a casa vai, eu fico aqui e depois voltas, aproveitas para descansar um bocadinho.- disse.- não deves estar nada confortável nesse sofá.

*Dylan*
Encolhi os ombros encostando a cabeça ao sofá e suspirei - não faz mal, quando ele voltar para casa eu também volto - respondi. Pelo menos sabia que ele ia voltar para casa.

*Doze horas depois*
*Ryan*
Abri os olhos lentamente, mas rapidamente tive que os fechar, por causa do sol que vinha da janela. A minha cabeça ainda doía e aquele sol todo só fazia pior. Suspirei baixinho tentando remexer-me ali, como era normal, mas mal o consegui fazer, visto que as minhas pernas não se moviam. Só aí é que despertei. Abri totalmente os olhos olhando para o banco onde anteriormente Dylan e reparei que ainda ali continuava. Suspirei, apesar de já saber que Ariel não o ia conseguir convencer.

Visto que não tinha conseguido convencer Dylan, como já seria de esperar, voltei para junto de Ryan, dormindo apenas mais algumas horas. Desde que ali estava que andava com o sono demasiado leve e, apesar de me sentir extremamente cansada, não conseguia dormir. Abri os olhos, apesar de já estar acordada há bastante tempo, e olhei para Ryan, que ainda dormia. Acariciei-lhe a face, levantando-me com cuidado e saí do quarto. Precisava de avisar os meus pais. Peguei no meu telemóvel, mandando-lhes uma mensagem e fui de seguida comprar um café, bebendo-o à medida que voltava para o quarto. Ainda era cedo, mas o sol já irradiava todo o quarto. Abri a porta devagarinho, para o caso de os dois ainda estarem a dormir, mas assim que entrei, vi Ryan já acordado. Sorri-lhe, aproximando-me da cama, mas o meu sorriso foi desaparecendo à medida que vi que olhava para Dylan.
- Ele não quis ir embora.- murmurei baixinho assim que cheguei junto de si.- eu tentei, mas ele é tão teimoso quanto tu.

Desviei o olhar do meu irmão para a porta que se abria lentamente e vi de Ariel entrar. Assenti com a cabeça e um meio sorriso - eu sei - murmurei com um suspiro e ainda meio atordoado por causa do que me tinham dado para dormir. - Já avisaste a tua família? - perguntei clareando a garganta para que ela me conseguisse perceber melhor. Não tive tempo de conseguir perceber a sua resposta porque a porta voltou a abrir-se e de lá entrou o meu médico. Ele sorriu quando me viu acordado e aproximou-se de mim.
-Bom dia, estás com melhor aspeto.
-Aposto que sim - comentei num tom um bocado seco, mas ele lá sorriu de novo e olhou para Ariel com um pequeno encolher de ombros.
-Quando é que eu posso ir para casa? - perguntei.
-Quando eu tiver a certeza que já não há perigo de mais sangramentos, vou mandar-te fazer uns exames à tarde, antes da hora das visitas.