Varanda

Mike semicerrou os olhos a Ryan, passando depois a mão pelo seu cabelo e encostou a cabeça ao meu ombro, enquanto eu os levava para a cozinha.
- Desculpa.- pedi com uma pequena gargalhada quando percebi que estava a andar demasiado depressa e abrandei o passo, sorrindo à minha mãe quando chegámos à cozinha.
- Vieram mesmo na altura certa.- ela brindou-nos com o seu sorriso, pousando o bolo acabadinho de fazer em cima do balcão.- cuidado que ainda está quente.- pousei Mike em cima do balcão e dei-lhe uma palmadinha na mão para que a afastasse do bolo.
- Não sejas guloso Michael.
- Mike.- revirou os olhos.- é Mike.- pus-lhe a língua de fora, como uma criança e fui ajudar a minha mãe com as bebidas.

Sorri quando deu uma gargalhada, eu podia só a conhecer à dois dias ou três, mas nunca a tinha ouvido a dar uma gargalhada daquelas, sem dúvida que agora me sentia bem, só faltava pô-la a vontar no mar e depois sim... Estiquei uma mão ao mesmo tempo que Mike, para o bolo e arregalei os olhos assim que ela lhe bateu na mão, fazendo-me endireitar também. - Ainda não se pode? Eu gosto de bolo de chocolate.

Tive de me colocar quase em cima do balcão para conseguir chegar aos copos, o que me fez revirar os olhos de forma exagerada.
- Eu não percebo porque é que o pai quis os armários tão em cima.- resmunguei baixinho e pousei os mesmos sobre o balcão.- leite ou su..
- Leite! - Mike antecipou-se, sorrindo-me todo contente. Ri-me abanando a cabeça e enchi um copo com leite, dando-lhe.
- E tu? - olhei para Ryan e assenti quando me perguntou se se podia.- podes, tu podes.
- Ei! - Mike resmungou, olhando-me todo amuado, com um bigode de leite por cima dos seus lábios.

Levantei a cabeça quando ela me perguntou se queria leite ou sumo e olhei para as duas embalagens - pode ser leite - disse com um sorriso brincalhão apesar de estar a falar a sério. Olhei para Mike e ri-me partindo um bocado do bolo e dando-lhe um bocado - toma um bocado, eu deixo - brinquei.

Revirei os olhos com um sorriso com o sorriso de Ryan e enchi um copo com leite, estendo-lhe.
- Tu és fixe.- ouvi Mike e quando olhei para ele, já ele estava todo deliciado a comer o bolo, ou melhor, devorá-lo.
- Golpe muito baixo esse menino Ryan.- apontei-lhe um dedo e sentei-me, também com o meu copo de leite na mão.
- Então e tu Ryan, o que é que fazes? - a minha mãe sentou-se ao meu lado, olhando-o.

Ri-me quando Ariel percebeu que lhe tinha dado um bocado de bolo e olhei para Mike - eu sei que sou fixe, sou como tu - engoli todo o meu bolo e olhei depois para cima, para a mãe deles os dois com um sorrisinho - sou surfista. - sorri pegando noutro bolo - a senhora cozinha mesmo bem.

Mike mexeu as sobrancelhas com um risinho e continuou todo entretido a comer a sua fatia de bolo.
- Também és surfista? - a minha mãe perguntou surpreendida.
- É um dos melhores.- murmurei eu.
- Tal como tu..- foi a vez de ela me olhar. Engoli em seco, assentindo e desci o olhar para o meu prato.

Comi mais um bocadinho do bolo e levantei o olhar por ver a sua mãe tão surpreendida. Assenti com a cabeça quando perguntou se também era. Limitei-me a sorrir quando ela disse que era um dos melhores - Ela é muito boa - disse assentindo, eu tinha seguido o trabalho dela, apesar de não a ter reconhecido logo. Olhei para Ariel e toquei-lhe no queixo para levantar o seu olhar.

- Pois é, e eu vou ser como ela.- ouvi Mike falar todo orgulhoso e fechei os olhos com força quando senti as lágrimas ameaçarem aparecer. Levantei o olhar quando senti tocarem-me no queixo e olhei Ryan, abanando a cabeça como que a dizer-lhe que não aguentava. Eu já não era o que eles me desenhavam, eu tinha deixado de ser boa no dia em que tudo acontecera, eu já não era mais a razão de orgulho deles.
- Eu acho que ela não se devia deixar afectar pelo que aconteceu.- foi a vez da minha mãe falar.-ela adorava tanto o que fazia.- ouvi-a suspirar.
- É mais complicado do que o que pensas.- cerrei o maxilar.

Suspirei quando abanou a cabeça e fiz o mesmo, ela tinha que ser forte, senão nada disto ia acabar e tinha que acabar, eu tinha que a ajudar a tempo e mesmo que não tivesse eu arranjava-o. Levantei o olhar para a mãe dela e sorri-lhe.
-Ela vai conseguir, não se preocupe. - garanti-lhe. Agora tinha prometido a mais uma pessoa.

Virei a cara para um lado que não o deles quando as lágrimas começaram a cair e passei as mãos pelas bochechas, fungando.
- Ela vai voltar a ganhar muitos concursos, não é? Eu sei que ela vai.- Mike olhou Ryan.- e depois vai ensinar-me a ser como ela, ela prometeu.- conseguia sentir o entusiasmo na sua voz. Continuei a olhar para outro lado enquanto abanava a cabeça e bebi todo o leite do meu copo de rajada.

Olhei para Mike com um sorriso e assenti com a cabeça dando-lhe uma pequena festinha na cabeça. - Claro que vai - sorri - ela promete, cumpre - olhei para Ariel e respirei fundo - posso falar contigo? - perguntei baixinho enquanto-me mais a ela.

Eu não aguentava, estavam todos à espera de coisas. Estava tudo a puxar por mim, quando parecia que ninguém percebia que eu não ia conseguir. Mike assentiu, voltando a concentrar-se no seu bolo e a minha mãe levantou-se, indo arrumar as coisas. Desviei o olhar para Ryan e assenti, levantando-me e comecei a andar para a sala, esperando que ele me seguisse.

Agarrei-lhe na mão assim que chegámos à sala e virei-a para mim.
-Eu sei o que estás a sentir - disse-lhe - todos esperam que tu voltes, e tu sentes que não vais voltar, mas tu vais, eu prometi. Não te deixei ir a baixo, isto deve fazer-te é bem - toquei-lhe com um dedo no meio to peito e sorri levemente. - é bom eles terem esperanças em ti.

Cerrei o maxilar assim que o senti agarrar-me no pulso e baixei o olhar enquanto ele falava, sentindo as lágrimas formarem-se de novo nos meus olhos.
- Mas não há esperança nenhuma Ryan.- funguei.- tu viste como é que eu fiquei só de entrar numa banheira? Numa banheira! - abanei a cabeça.- podes continuar a tentar, mas...eu sou uma causa perdida.- encolhi os ombros.- já me convenci disso.

Juntei as sobrancelhas enquanto ela falava e comecei a abanar a cabeça, eu detestava falar da forma como ia falar, mas se lhe tinha que abrir os olhos tinha que ser assim.
-Uma causa perdida sou eu - apontei para mim - vou morrer dentro três meses, tu não. - olhei os seus olhos - Quase morreste por causa do mar e tens medo dele, eu vou morrer por causa da vida e não tenho medo dela - agarrei-lhe numa bochecha - acorda Ariel, tu consegues.

Encolhi-me quando ele começou a falar e sentei-me na perna do sofá, baixando cada vez mais o olhar com as coisas que ele dizia.
- Tu não és uma causa perdida.- abanei a cabeça.- não penses assim..- murmurei baixinho. Não que eu tivesse moral, mas não conseguia ouvi-lo falar assim.

Puxei-a para a abraçar enquanto ela beijava o olhar e fiz-lhe festinhas nas costas - mas é verdade e eu não me importo - disse olhando-a - não faz mal, só quero que não penses que és uma causa perdida, quando não és. Estás viva, não estás? Consegues usar o teu cerebro não consegues? Então não és.

Fechei os olhos com força mal a minha bochecha ficou esmagada contra o seu peito e abracei a sua cintura com os meus braços, ficando abraçada a ele. Eu não sabia explicar, mas era como se o conhecesse a minha vida inteira. Era estranho conhecermos-nos há tão pouco tempo e ele já ter feito tanto por mim. Só esperava poder retribuir de alguma forma.
- Mas importo-me eu.- levantei o olhar para ele.- não quero que digas isso, está bem? - olhei-o.- eu não digo se tu não disseres também.

Baixei o olhar para ela e sorri levemente, assentindo com a cabeça. - Eu não digo - toquei-lhe na bochecha, afastando-me depois antes que alguém aparecesse e fizesse um filme de sete cabeças. - Agora vem, eles só têm esperanças, e eu também tenho esperanças para ti. Tu também devias ter.

Assenti quando disse que não dizia e passei as mãos pelo meu cabelo depois de ele se ter afastado. Limpei a minha cara e respirei fundo, olhando-o enquanto falava.
- Vocês acreditam demasiado em mim.- abanei a cabeça.- ainda vos vou desiludir, mais uma vez.- suspirei baixinho e virei costas, indo de volta para a cozinha.

Abanei a cabeça com um suspiro e fui atrás dele até à cozinha, sorrindo à sua mãe e voltando-me a sentir - posso comer mais um bolo? Está mesmo bom e tem um bom aspecto... - mordi o lábio, esticando-me até mais uma fatia.

Senti o olhar da minha mãe em mim assim que entrámos na cozinha, mas nada disse, uma das coisas que mais apreciava nela é que ela percebia quando não devia insistir. E este era um desses momentos, eu só queria esquecer, mas sabia que quando o meu pai chegasse, as perguntas iam começar.
- Está à vontade.- ela falou para Ryan.- podes comer as fatias que te apetecer, foi para isso que eu o fiz.
- Então isso quer dizer que eu também posso? - desviei o olhar para Mike e vi-o a fazer olhinhos à minha mãe. Abanei a cabeça com um semi sorriso e recostei-me no banco.
- Não mudaste mesmo nada pirralho.

Sorri à sua mãe e estiquei-me até ao bolo olhando para as duas fatias que tinha tirado - isso não te faz mal? - perguntei de olhos semicerrados, acabando por lhe dar a fatia assim que me deram autorização. Ri-me agarrando melhor na minha e comecei a devora-lo - Se vendesse isto, aposto que ia ser uma mulher rica, toda a gente ia comprar

- Deixa-o o comer, é só desta vez.- disse a minha mãe em tom de aviso para Mike. Ele revirou os olhos, mas acabou por ficar mais contente quando Ryan lhe deu a fatia de bolo.- e obrigada querido, ainda bem que gostas, é o bolo preferido deles.
- Eu já te disse que és fixe? - Mike falou com a boca toda cheia, fazendo-me revirar os olhos.
- Não sejas chato Michael.